segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Cuidado

O cara acenou, soltou um sorriso amarelo: cuidado, criança! Lobo também veste pele de cordeiro. Ele disse para você ir embora e sem nenhuma justificativa – banalidade da vida, maldito subjetivismo, terrível setembro – também foi. Então você até pode limpar a casa, pintar as paredes, então, quando os espaços estiverem em branco, quando as prateleiras estiverem vazias, a cama arrumada, a janela aberta: cuidado, criança! Não é porque ele disse que iria embora, que ele realmente tenha ido. Ele até pode tirar o passaporte, conseguir uns vistos. Mas ele não embarca, não embarca não, não sem você.

Então, como bandeirinha no vento, criança, você se balança assistindo aos dias passar, lembrando dele, pensando nele, falando nele, falando dele. Mas nem todo mundo é bom, nem todo mundo tem parque de diversões no coração. Tem amigo que nos vê com o dedo no gatilho e diz: aperta! Infelizmente tem gente que é assim, gosta de compartilhar o seu próprio vazio, o seu próprio egoísmo. Tem sempre aquela coisa, eu não tenho: ninguém precisa ter.

O cordeiro aparece de repente como quem não quer nada. Primeiro ele pasta ali e aqui, espera até que você o perceba. Crianças prestem atenção: raposa é animal selvagem todo mundo teme, ninguém passa a mão, ninguém acaricia, mas essa é a natureza dela. Já cordeiro, é figurado, é sempre macio, é sempre acariciado por todo mundo, cordeiro branquinho, jeitinho de nuvem, entendam: é lobo, apenas lobo em pele de cordeiro.

Você se aproxima, faz um carinho, já era, tarde demais, criança. Depois de algum tempo, ele tira a pele, pronto: é lobo. Sujo, pelo raso, aspecto de quem não come porque a caçada não está fácil, porque quando a pele cai ninguém gosta do que fica. Lobo é traiçoeiro. E o cara faz isso também, se mostra bonito, macio, te leva para lugares novos, tudo parece tão bom, não? Então quando você percebe tarde demais, criança. Você fica tão fascinada com os novos brinquedos, com as palavras, que nem percebe como ele fede e como suas garras estão enterradas em suas costas.

Se parar para pensar, ninguém vai intervir, e quando o lobo estiver na altura do seu pescoço, já era. Então ai que ele, seja a raposa, o príncipe, como você quiser chamar, aparece. Pois tais alegrias violentas possuem fins, também violentos, como escreveu Shakespeare. E ele então, lutará, pois no fundo sabe que sempre existirá aquela criança, ainda pura, e com o tempo as marcas e o cheiro deixado pelo lobo, também iram passar, vai passar. Talvez ele leve um tempo também para curar as cicatrizes, pois as garras de um lobo são bem maiores que as de uma raposa, e se por acaso ele não se curar, saiba criança, morrer de amor, também é no incondicional, viver dele.


José L.

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